sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CIRANO DIAS ENTRA PARA GALERIA NACIONAL DA SANFONA DE 8 BAIXOS


'o mestre do pé de bode'


Ele é de Dom Inocêncio-PI, “Terra dos Sanfoneiros”. Veja o relato de Marcos Damasceno sobre Cirano Dias. A partir de agora, seu nome está reconhecido a nível nacional!


(Cirano Dias)

Cirano Dias, de saudosa memória, sanfoneiro do município de Dom Inocêncio-PI, herdeiro do patriarca e pioneiro Júlio Dias figura agora na galeria dos grandes nomes nacionais da sanfona de 8 Baixos – ver (sanfonade8baixos.blogspot.com) – considerado um iluminado do sertão. Ele vai para a lista de grandes mestres como Seu Januário, Mestre Aureliano (pai de Pedro Sertanejo), Abdias, Zé Calixto, Antenogénes Silva, Tio Bilia, Hermeto Pascoal, Renato Borghetti, dentre outros.


O escritor Marcos Damasceno, autor de sua biografia, e que influenciou na campanha, comemora:
- Nada é impossível àquele que tem fé. Desde que publiquei no Portal SRN sua história, eu almejava reconhecimento para um sanfoneiro de tal importância. Um sacrifício de grande valia, pois saímos da fase da tradição oral, ter a história somente na boca das pessoas, sofrendo por vezes algumas distorções através de perigosas investidas, para termos um registro; um reconhecimento. E ainda nacional. Isso é gratificante.

- Cirano Dias sempre se preocupou com o futuro dessa história e assumiu responsabilidades. Enfrentou verdadeiros desafios, quando nossa terra ainda galgava os primeiros passos de sua história centenária. Ele acreditou heroicamente no sucesso dessa história, e contribuiu significativamente para a tradição, já centenária. Sentiu o sabor amargo do grande desafio de consolidar uma longa caminhada do forró. Sanfoneiro. Ele já nasceu assim. Nasceu num período em que o forró estava aflorando. Provou que Cultura é simplesmente a manifestação da experiência das pessoas. A tradição, a história e a visão de um povo. Estou muito contente de ver hoje seu nome ser lembrado.

Segundo Damasceno, o aprendizado é transmitido de pai para filho. A tradição também. E que na maioria dos casos, os sanfoneiros tocam “de ouvido”, isto é, sem nenhuma instrução teórica ou educação musical formal. Cirano Dias é filho do patriarca do forró regional, Júlio Dias da Silva. Seus irmãos Vavá, Rodolfo e Julinho também são sanfoneiros; mas Vavá e Julinho já falecidos. Desde criança se dedicou ao instrumento de 8 baixos, tornando-se uma lenda do forró brasileiro. Cirano Dias tem dois filhos sanfoneiros: Vagner e Menezes (de saudosa memória). Vagner deu continuidade à tradição da sanfona de 8 baixos. Até hoje tem o instrumento que era do seu pai, que para ele tem enorme valor sentimental. E histórico.


A história está registrada em dois livros: “Júlio Dias: memória de um grande homem”, de autoria de Marcos Damasceno e Marivalda Dias; e “Gigantes do Forró: perfis biográficos”, de autoria de Marcos Damasceno.
O sanfoneiro Adão da Rufina, de Dom Inocêncio-PI, mas que reside no Estado de São Paulo, conta:

- Júlio Dias foi um mestre, de quem tenho eterna admiração. E no quesito forró ele é respeitado. A história do forró regional se confunde com a história dele. A sanfona de oito baixos é difícil de executar. Precisa habilidade. O ensino é oral, quase não existem métodos como para sanfona-piano. O sanfoneiro tem
de gostar do instrumento. Júlio Dias e seus filhos sempre foram vocacionados para a sanfona. Cirano Dias foi meu amigo. Tocava muito. Numa sanfona, em afinação natural, conseguia tirar chorinhos. Além dos forrós. Não sei como. Ele foi um dos maiores no segmento
.
           


Mestre Adão da Rufina prossegue:

– Não se aprende tocar 8 baixos na escola de música. Não existe escola para ela. Existem sim mestres, que preservam a tradição. O ensino passa de pai para filho. Quem entende desse histórico instrumento musical sabe o quanto é difícil tocar nele. A sanfona de 8 baixos é mais difícil do que as outras. Muito diferente. Tem suas particularidades. Requer certas habilidades para manuseá-la. Uma curiosidade: no começo da sanfona, em geral no Brasil, zona rural, não havia rádio. As músicas passavam um ano para os sanfoneiros aprenderem, pelo menos alguns versos. Logo transformavam em som, forró solo-instrumental. Se o forró não tiver boa letra, é melhor só tocar. O sujeito dança ainda melhor.

O sanfoneiro Vavá Dias, seu irmão, de saudosa memória, contou:
- Cirano dormia com a sanfona. Tocava toda hora, todo dia. E tocou a vida toda. Foi ele um dos responsáveis pela abertura de olhares para a diversidade da música na nossa terra. Estudava repertórios, que ouvia no rádio. Aprendia e ensinava aos outros sanfoneiros. Onde quer que ele fosse, se apresentava com sua sanfona de 8 baixos. (Fonte: “Gigantes do Forró: perfis biográficos”)




Leo Rugero, maestro do Rio de Janeiro-RJ, relata:

- Sinto-me honrado em fazer uma referência ao trabalho de Marcos Damasceno. Ele que tem empreendido uma obra de extrema importância àqueles que procuram novas fontes de pesquisa sobre a cultura nordestina, em particular a tradição musical relacionada à sanfona. No meu caso particular. Em período anterior à fonografia comercial destinada a este segmento. À exceção do "velho" Januário, devido a seu posicionamento privilegiado de "vovô do Baião", haviam raros relatos escritos sobre os sanfoneiros deste período. Era como tentar descortinar uma história de um passado distante no tempo, quase uma arqueologia sonora.
- Porém, em meio à escassez de escritos e transcrições de relatos e narrativas orais, me deparei com um trabalho que despertava atenção, não apenas pela rara historicidade nele contida, bem como pelas fontes iconográficas e reflexões sociológicas. Tratava-se do trabalho do professor Marcos Damasceno sobre Júlio Dias, eminente sanfoneiro piauiense da virada do século XX. O município de Dom Inocêncio, no Piauí, foi um dos importantes centros de difusão da prática do fole de oito baixos no sertão nordestino, a ponto de ser conhecido como "A TERRA DOS SANFONEIROS".
- Um aspecto importante na metodologia de Marcos Damasceno é o de separar a noção de tradicionalismo em relação ao obscurantismo, buscando conciliar o legado cultural e a ancestralidade com a mudança e as linhas de continuidade e descontinuidade que se apresentam no percurso histórico. Indubitavelmente, o trabalho de Marcos Damasceno ocupa um espaço de relevância entre os novos discursos acerca da cultura nordestina. (Fonte: “Gigantes do forró: perfis biográficos”).

Cirano Dias é um mestre de tantas experiências vividas, histórias para contar e heranças musicais. Merece esse reconhecimento. Um tributo ao mestre da sanfona de 8 Baixos.




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